Nos anos 90, foi finalmente esclarecido o mais fascinante arquétipo mitológico da História humana: o mito das Amazonas, baseado em lendas cultivadas de um fato real: a antiga sociedade matriarcal da Ilha de Creta, descrita nas ruínas e nos registros do alfabeto grego primitivo há mais de 5 mil anos atrás, berço da Grécia e da civilização ocidental desde 3200 antes de Cristo.
Antes de povoarem o continente com os deuses do Olimpo, os gregos cretenses cultuavam a Deusa-Mãe Terra (Gaia) e construíram uma civilização incrivelmente avançada para a época, com as famílias centradas a partir da autoridade da mãe. Lembre-se que então os povos eram pagãos, com religiões politeístas de deuses e deusas igualmente poderosos. Na mitologia grega, das Amazonas, diziam serem filhas da ninfa Harmônia com o próprio Deus da Guerra, Ares. Seriam protegidas também pela Deusa da Caça, Ártemis. De acordo com Diodoro, a rainha amazona Myrine liderou-as na vitória contra os Atlantes, Líbios e Górgonas, quando “o povo dos deuses” tentou conquistar o mundo. Na vida real, a História e seus acontecimentos foram mais nebulosos, e só a arqueologia avançada, com exames de DNA e carbono 14, conseguiu lançar luz aos fatos de maneira definitiva e comprovando as origens factuais por trás do “mito”.
A única dúvida que ainda restava sobre a veracidade dos relatos de uma sociedade assim era de ordem prática: como seria possível uma mulher ter força para manejar o peso da armadura, capacete, armas e escudo de metal? A resposta está na própria época em que surgiram, milhares de anos antes de Cristo: na Era do Bronze, o metal a carregar era bem mais leve. “As Amazonas só podiam ter surgido mesmo na Idade do Bronze.” avaliam os historiadores. Embora algumas tribos tenham sobrevivido até o final do Império Romano, foi principalmente entre 3200 e 1000 a.C que sua cultura floresceu e se expandiu pelas nações do Mar Mediterrâneo, sendo até aceito como “um fato da vida” mesmo pelos machistas mais inconformados. Por quê justo naquela época? Porque foi esse o período dos primeiros impérios comerciais do Mar Mediterrâneo, cujas nações experimentaram um fluxo intenso de trocas e contatos entre diversas culturas, considerada a primeira globalização.
Um cartógrafo desconhecido, no mapa de 1770, localiza a “Terra das Amazonas” no norte da Sarmatia Asiática, baseado em pesquisas na literatura grega.
Todos os arqueólogos e historiadores são unânimes em apontar a origem da tribo das mulheres guerreiras: a grande Cordilheira do Cáucaso, próxima ao Mar Negro, região hoje ocupada por Armênia, Azerbaijão, Geórgia e Rússia. Há 5500 anos, aquela área ainda era um celeiro (melhor seria dizer vespeiro) de povos bárbaros tão primitivos que nem tinham língua escrita, vivendo principalmente da caça, em culturas matriarcais, como as amazonas e os gargareans, sauromatians, albanianos e cimérios (sim, o povo de Conan).
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Havia tribos com soldados homens e mulheres. Os antigos gregos chamavam o sistema deles de “Ginocracia” (sociedade regida por mulheres). Inventaram o machado de guerra, arma de dois gumes iguais, usado por homens e mulheres, representando a igualdade. O historiador grego Heródoto (485 – 420 a.C.) já descrevia aquela região como “inóspita, intimidadora, sempre á sombra das montanhas e com o céu coberto de neblina; um lugar onde só os extremamente fortes sobrevivem; uma terra de trevas e noite eterna.”Não admira que todos os outros povos fugissem de lá. Mesmo os terríveis citas, que povoaram a Europa com a cultura celta, ficaram chocados com a violência daquele povo, inclusive das mulheres, chamando-as de oiorpata (“chacinadoras de homens”). Enquanto os gregos fizeram menos cultos ao Deus da Guerra, os arianos do Cáucaso pareciam cultuar Ares como um deus central, tornando-se Mestres da Guerra praticamente invencíveis, com a fama de serem guerreiros perfeitos. Eram descritos como indivíduos “de pele branca como a neve, olhos grandes bem abertos, de mulheres e homens altos, medindo entre 1,80 m e 2,20 metros, extremamente musculosos, arrogantes, corajosos e muito, muito fortes mesmo”.
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O historiador grego Strabo (64 aC – 23 dC), escreveu em sua Geografia: “Também as Amazonas vivem nas montanhas do Cáucaso. Exercitam até artes marciais. Vivem da agricultura, pesca e caça nas florestas. Essa região é de vastos campos férteis e saudáveis, com jardins de frutas. Os povos daqui rezam para a Terra, o Sol, a Lua e outros astros. (Havia um templo dedicado á Lua.) Elas tinham filhos se encontrando uma vez por ano com os melhores guerreiros vizinhos, os gargareans, uma tribo só de homens. As filhas ficavam com as amazonas, e os meninos eram entregues aos pais.”
O historiador romano Plutarco (46aC-19dC) registrou um contato do general do Império Romano Pompeu em 66 aC: “Nesta batalha, as Amazonas lutaram junto com os bárbaros (Albanianos). Mais tarde, fizeram destemidos ataques surpresa contra as legiões. Logo a maioria dos legionários estavam mortos ou feridos. Por isso, o general Pompeu não conseguiu alcançar o Mar Cáspio e retornou.” Aquela parte do Cáucaso nunca foi conquistada pelo Império Romano. As Amazonas tomaram parte importante na resistência.
ARTE MINÓICA – Uma mulher agarrando um touro pelos chifres. Um dos esportes mais populares na Era de Ouro Minóica.
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Em 3500 aC, alguns desses povos já migravam para o Mar Mediterrâneo: e um deles povoou a Ilha de Creta. Lá se abandonou o nomadismo, plantou-se as bases do Ocidente e a cultura mais refinada floresceu no reino de Minos, com a extraordinária sociedade minóica. Era o paraíso matriarcal. As meninas eram educadas nas mesmas atividades com os rapazes.
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Mulheres também trabalhavam em cada ocupação e negócios com os homens. Eram habilidosas empresárias, industriais, marinheiras, políticas e militares. As jovens participavam até de esportes incrivelmente violentos e perigosos, como boxe, artes marciais e “salto ao touro”. O sacerdócio foi dominado por mulheres.
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Na arte minóica, figuras femininas parecem retratadas acima de seu pares masculinos, pintadas duas vezes maiores que eles. Os machos aparecem pequenos em escala, comparados à fêmea dominante. O Período Minóico também parece sugerir que os homens quase nunca estavam empenhados em guerras. Deusas e mulheres são retratadas em afrescos empunhando espadas e machados de batalha de dois gumes iguais, símbolo da igualdade.Foram 2000 anos de uma civilização brilhante, num período que foi chamado de Era de Ouro da Antiguidade Clássica. Com a invasão da Ilha de Creta pelo império patriarcal micênico a partir de 1200 a.C, essa civilização se mesclou a outras culturas, dando origem á Grécia. Quando houve o choque da cultura patriarcal de Micenas com a cultura minóica em Creta, o paraíso acabou e a maldição foi lançada sobre o “novo povo” como uma tragédia grega.
Daí por diante, o dilema do Ocidente seria a posição das mulheres na sociedade, abafando revoltas. Por rejeitarem a família patriarcal, a reação de muitas delas foi se tornarem cada vez mais competitivas até superarem os homens em tudo – principalmente pela força. O resultado foi o surgimento de uma tribo imensa de superfeministas vivendo numa sociedade inteiramente à parte na Grécia.
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Isso afrontou todos os costumes. Ao invadirem Creta, os patriarcalistas não faziam idéia da enormidade das consequências que desencadearam. Eles abriram a caixa de Pandora. Logo vieram os rumores da tribo de enormes mulheres guerreiras numa sociedade inteiramente militarizada. A estadista original que formulou os conceitos dessa sociedade única foi a rainha Hipólita, líder militar carismática que inspirou gerações de moças em todas as nações do Mediterrâneo, européias, africanas ou asiáticas, brancas ou negras, a abandonarem “o mundo do patriarcado” e se juntarem ás suas fileiras. Não admira o choque que elas causaram, mas os que mais se escandalizaram foram os gregos.
Uma das primeiras representações das Amazonas: em cerâmica de Creta, pintura retrata uma soldada sorridente carregando a companheira ferida após a vitória na batalha. Note o detalhe das pernas com os músculos ressaltados. A força física delas sempre impressionou os gregos.
Esta é a mais antiga imagem das Amazonas, num vaso de cerâmica grega cretense datada de 700 aC. No centro, uma amazona prestes a executar um inimigo, puxando-o pelo cabelo para degolá-lo, enquanto o soldado em terror implora piedade. Desde os registros mais remotos, elas sempre foram descritas por essa fama de implacáveis.
Mulheres guerreiras eram uma cultura estrangeira á solta na Grécia. Até pelas diferenças físicas: os gregos da época eram baixinhos de em média 1,65 e as caucasianas guerreiras eram arianas bem altas. Há inúmeras representações de guerras entre amazonas e atenienses, espartanos e micênicos. Os gregos sempre representavam as amazonas como o avesso de tudo o que as mulheres gregas deviam ser: submissas, silenciosas, limitadas ás tarefas do lar. As Amazonas eram apontadas como o mau exemplo completo, a ameaça á ordem, o perigo de uma guerra civil entre os sexos, em que os homens temiam perder tudo.
Analisando friamente, todos os assuntos concernentes às Amazonas seguiam um raciocínio bem lógico e de consequências previsíveis. Assim, sua economia precisava ser auto-suficiente, baseada na caça. Como precisavam fixar-se em poucos lugares, sabiam manter um desenvolvimento sustentável, dando uma lição de preservação ambiental.
Sua política era não declarar guerras desnecessárias, mas apenas revidar ataques ou aliar-se de acordo com as conveniências da época para ganhar mais poder, como quando se aliaram a Tróia. Enquanto sociedade, elas surgiram da idéia de uma nação legítima reconhecida por todos como um refúgio para mulheres precisando de uma alternativa de vida. Vem daí a aura de libertárias. Também precisavam evitar qualquer dissidência e rachas internos.
Por tudo isso, conseguiram manter uma sociedade harmônica e unida. Não admira que a mítica mãe da primeira Amazona seria a ninfa Harmônia, filha de Ares e Afrodite. Elas conseguiram conciliar a guerra externa com a paz interna. Daí que a igualdade total entre as amazonas seria uma utopia pela metade.
A vida entre as Amazonas era a de uma colméia que nem era matriarcal, mas unissexual. Isso gerou toda uma sociedade de uma única classe social, com uma rainha-abelha-general e sua corte de milhares de soldadas. Tamanha homogeneidade chegou a ser considerada nas lendas como uma raça á parte para os gregos. Na vida real, em 1100aC, já havia amazonas de várias origens étnicas, que tornaram-se uma cultura á parte.
Mulheres guerreiras eram uma cultura estrangeira á solta na Grécia. Até pelas diferenças físicas: os gregos da época eram baixinhos de em média 1,65 e as caucasianas guerreiras eram arianas bem altas. Há inúmeras representações de guerras entre amazonas e atenienses, espartanos e micênicos. Os gregos sempre representavam as amazonas como o avesso de tudo o que as mulheres gregas deviam ser: submissas, silenciosas, limitadas ás tarefas do lar. As Amazonas eram apontadas como o mau exemplo completo, a ameaça á ordem, o perigo de uma guerra civil entre os sexos, em que os homens temiam perder tudo.
Analisando friamente, todos os assuntos concernentes às Amazonas seguiam um raciocínio bem lógico e de consequências previsíveis. Assim, sua economia precisava ser auto-suficiente, baseada na caça. Como precisavam fixar-se em poucos lugares, sabiam manter um desenvolvimento sustentável, dando uma lição de preservação ambiental.
Sua política era não declarar guerras desnecessárias, mas apenas revidar ataques ou aliar-se de acordo com as conveniências da época para ganhar mais poder, como quando se aliaram a Tróia. Enquanto sociedade, elas surgiram da idéia de uma nação legítima reconhecida por todos como um refúgio para mulheres precisando de uma alternativa de vida. Vem daí a aura de libertárias. Também precisavam evitar qualquer dissidência e rachas internos.
Por tudo isso, conseguiram manter uma sociedade harmônica e unida. Não admira que a mítica mãe da primeira Amazona seria a ninfa Harmônia, filha de Ares e Afrodite. Elas conseguiram conciliar a guerra externa com a paz interna. Daí que a igualdade total entre as amazonas seria uma utopia pela metade.
A vida entre as Amazonas era a de uma colméia que nem era matriarcal, mas unissexual. Isso gerou toda uma sociedade de uma única classe social, com uma rainha-abelha-general e sua corte de milhares de soldadas. Tamanha homogeneidade chegou a ser considerada nas lendas como uma raça á parte para os gregos. Na vida real, em 1100aC, já havia amazonas de várias origens étnicas, que tornaram-se uma cultura á parte.
Amazona africana – ao fim da Idade do Bronze, as mulheres guerreiras já eram mais do que uma tribo bárbara caucasiana e se tornaram uma cultura multiétnica espalhando-se pelas nações mediterrâneas. A arqueologia comprovou que a cultura matriarcal dos bérberes venceu o proselitismo do Islã, mesclando-se na exceção de muçulmanismo moderado do Marrocos. Eis a origem da modernização islâmica marroquina – dos mouros que ocuparam a Península Ibérica na Idade Média e criaram o caso único de coexistência pacífica entre cristãos, maometanos e judeus.
Neste vaso grego da Idade do Bronze, uma Amazona negra do sul da Líbia.
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Mesmo após a morte, elas ficam em posição de montaria -
FOTO: Escavação arqueológica nas estepes do sudeste da Rússia.
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Há evidências de comunidades amazonas no Egito, Líbia e Itália (na ilha da Sicília, então na Magna Grécia). O que as unia era a rejeição ao patriarcalismo. Foi uma versão violenta dos movimentos de massa da juventude inconformada do século XX. Imagine a contracultura dos movimentos Hippie, Feminista e Punk se unindo numa cultura alternativa guerreira para sobreviverem áqueles tempos brutais.
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Por causa das pressões sociais daquela época efervescente, a cultura amazona tornou-se um fenômeno multicultural do mundo mediterrâneo da Idade do Bronze, com milhares de voluntárias em nações da Europa, África e Ásia. Mulheres e garotas revoltadas com suas famílias, fugindo de casa e aderindo ao novo e revolucionário estilo de vida. A cultura amazona foi o fenômeno social mais revolucionário e radical da História humana.
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Aquelas mulheres eram violentíssimas – disse Heródoto – para vencer os homens no campo de batalha e serem aceitas como uma potência respeitada e temida, precisavam ser as melhores militares possíveis, versadas em todas as artes da guerra desde a infância; e também tinham que usar a arma do medo. Daí cultivavam a fama de serem guerreiras realmente impiedosas, que jamais faziam prisioneiros. No máximo, deixavam apenas uns poucos sobreviventes fugirem para contar a história e espalhar o terror.
Eram combatentes terríveis, fazendo sempre ataques devastadores para assegurar a reputação de invencíveis. Como eram mais leves que os homens, avançavam mais velozes a cavalo, e na maioria das batalhas venciam sem tocar os pés no chão. Foram elas que inventaram o machado de guerra, arma de dois gumes que era o símbolo do poder matriarcal em Creta. Seu grande trunfo era o uso do arco e flecha, e equilibravam-se a galope atirando.Também encontraram uma saída original para as limitações do físico feminino. Para manter a mira certeira mesmo em movimento, com as alças das bainhas de armas cruzando o peito, elas cortariam metade do busto, ficando sem (a) um seio (mazo). Mas a cirurgia de extração do seio (mastectomia) talvez fosse feita por só uma tribo; elas sempre foram representadas com dois seios.A mutilação seria uma lenda dos homens para assustar as moças, desencorajando-as da idéia de largar a família e se juntar ás amazonas. A destreza inigualável de derrotarem exércitos sempre a cavalo tornou o nome delas o equivalente feminino de cavaleiro. Cultuavam o Deus da Guerra e a Deusa da Caça e só atacavam em grandes batalhões de cavalaria avassaladores, trucidando a todos e dominando as noções de estratégia e tática das falanges que seriam usadas mais tarde pelos atenienses e espartanos.
Elas enlouqueciam os homens gregos, inspirando-lhes sentimentos contraditórios de raiva, admiração, medo, inveja e desejo. Rivais insuperáveis, adversárias imbatíveis e fêmeas inconquistáveis, só lhes restava imaginar fantasias. E esse desejo frustrado de conquista era desabafado na mitologia. Com um ou outro grande herói grego vencendo e desposando uma Amazona, mesmo temporariamente, a fantasia coletiva dos gregos era irreprimível. Mesmo Aquiles se apaixonou perdidamente pela rainha Pentesiléia, “de beleza tão divina mesmo após a morte” que ele até matou um companheiro grego que tentou maltratar o corpo dela.
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Os atenienses nos cemitérios militares faziam grandes homenagens póstumas nos túmulos das suas adoradas inimigas.
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“Matadoras de Homens” (Heródoto), naturalmente, o pensamento bélico delas era criado por sua própria situação única e extraordinária de minoria isolada de sexo frágil sob risco de extermínio. Para minimizar os riscos, preferiam se esconder habitando áreas afastadas, mas também impor respeito e temor. Como odiavam o mundo do patriarcado, elas não podiam confiar em ninguém, e nem poderiam se dar ao luxo de escravizar outro povo, como os espartanos. Assim, a doutrina militar das Amazonas era baseada no princípio da concentração máxima de força para assombrar qualquer exército e esmagá-los numa onda avassaladora.Para destruir a moral do adversário, a atitude era semear choque e pavor. Elas sempre semeavam o pânico entre os oponentes que não tivessem nervos de aço ao encará-las. Elas atacavam sempre com força total para aniquilar o inimigo de uma vez, eliminando o risco de qualquer represália futura. Por isso preferiam não fazer prisioneiros, impondo o choque. Também por isso era um procedimento lógico deixar uns poucos sobreviventes escaparem, para espalhar o pavor.O fenômeno que marcou o desaparecimento da sociedade das amazonas também definiu o início da Idade do Ferro: a Guerra de Tróia por volta de 1000 a.C.
Quando os metalúrgicos da Grécia continental aprenderam a dominar a técnica de fundir o ferro – metal mais duro, pesado e resistente – e produzir o aço que rompia os escudos e armas de bronze dos troianos, a então nascente Grécia virou a mesa e destruiu o maior império colonial da Antiga Era.Já se falava sobre as Amazonas lutando ao lado de Tróia na Ilíada de Homero, a primeira narrativa do Ocidente; mas se na época houve registros de sua existência, eles desapareceram na devastadora guerra contra o Império comercial de Tróia, cuja grande capital ficava na porta de entrada do Oriente e controlava as rotas comerciais da Ásia. O evento foi tão cataclísmico que não houve vencedores: todas as civilizações do Mar Mediterrâneo foram varridas do mapa, incluindo a Grécia.A narrativa mítica foi uma maneira de condenar a tragédia apocalíptica da guerra passando a imagem falsa de que os helenos não foram também derrotados, nem o vil motivo real da guerra: disputas econômicas. O cataclismo histórico da Primeira Grande Guerra Mediterrânea destruiu todas as antigas potências, marcou o fim da Idade do Bronze e fez o mundo cosmopolita mediterrâneo retroceder á vida no campo.
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O antigo mundo épico estava morto, enterrado e esquecido; apenas alguns fragmentos seriam preservados na memória dos poemas de Homero, lembrando um mítico mundo heróico. Esse retrocesso do povo grego, com a lenta recuperação do progresso anterior, foi o Período Homérico. Nele, os relatos do mundo que ainda aceitava as amazonas se fundiram ao folclore da mitologia dos deuses.
“E os soldados gregos, horrorizados com aquela cena tão chocante e brutal, atiraram-se ao mar, gritando: Androcthones! (assassinas de homens). Heródoto, “o pai da História”, documentou relatos do século 5° aC, descrevendo um grupo de mulheres que enfrentaram os gregos na Batalha do rio Térmidon, em sua capital Themiscira, na Ásia Menor.
Numa batalha comum da época, morreram apenas 20% dos soldados de cada lado. Surpresos e impressionados com a resistência e bravura das soldadas, os gregos não executaram as prisoneiras, que foram levadas em navios para serem vendidas como escravas. Eles ainda não sabiam com quem estavam lidando. Mas a surpresa maior viria em seguida. Elas se libertaram, tomaram o controle dos navios e mataram todos os soldados gregos a bordo. Relatos dos sobreviventes que se lançaram na água testemunham que o plano delas era exatamente esse: conseguir um transporte por mar.
Mas, sem experiência na Marinha e inábeis para navegar, as mulheres mudaram o curso, seguindo as correntes do Mar Negro até as costas do Cáucaso – exatamente onde as lendas as situam. As Amazonas de Heródoto atingiram o território dos Cítios, um povo nômade guerreiro de arianos do Cáucaso.
Essas mulheres guerreiras, diz Heródoto, casaram com os Cítios e os convenceram a migrar para as planícies de campos da Eurásia, cruzando as altas montanhas do Cáucaso e os desertos do Mar Negro até se fixarem nas estepes russas – o povo russo usa o alfabeto grego.
A primeira evidência direta do status dessas mulheres guerreiras veio com as escavações arqueológicas recentes. Isso se confirmaria em 1996, com a descoberta de tumbas de fósseis de mulheres armadas para a guerra e a caça nas planícies russas. Nas 150 tumbas do século 5° aC encontradas perto de Pokrovka, nas estepes do sudeste da Rússia, encontram-se soldadas enterradas com armamento militar, muitas com ferimentos de batalha. Junto com espelhos, brincos, colares e outros adornos femininos ricamente elaborados em ouro.
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Há evidências de comunidades amazonas no Egito, Líbia e Itália (na ilha da Sicília, então na Magna Grécia). O que as unia era a rejeição ao patriarcalismo. Foi uma versão violenta dos movimentos de massa da juventude inconformada do século XX. Imagine a contracultura dos movimentos Hippie, Feminista e Punk se unindo numa cultura alternativa guerreira para sobreviverem áqueles tempos brutais.
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Por causa das pressões sociais daquela época efervescente, a cultura amazona tornou-se um fenômeno multicultural do mundo mediterrâneo da Idade do Bronze, com milhares de voluntárias em nações da Europa, África e Ásia. Mulheres e garotas revoltadas com suas famílias, fugindo de casa e aderindo ao novo e revolucionário estilo de vida. A cultura amazona foi o fenômeno social mais revolucionário e radical da História humana.
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Aquelas mulheres eram violentíssimas – disse Heródoto – para vencer os homens no campo de batalha e serem aceitas como uma potência respeitada e temida, precisavam ser as melhores militares possíveis, versadas em todas as artes da guerra desde a infância; e também tinham que usar a arma do medo. Daí cultivavam a fama de serem guerreiras realmente impiedosas, que jamais faziam prisioneiros. No máximo, deixavam apenas uns poucos sobreviventes fugirem para contar a história e espalhar o terror.
Eram combatentes terríveis, fazendo sempre ataques devastadores para assegurar a reputação de invencíveis. Como eram mais leves que os homens, avançavam mais velozes a cavalo, e na maioria das batalhas venciam sem tocar os pés no chão. Foram elas que inventaram o machado de guerra, arma de dois gumes que era o símbolo do poder matriarcal em Creta. Seu grande trunfo era o uso do arco e flecha, e equilibravam-se a galope atirando.Também encontraram uma saída original para as limitações do físico feminino. Para manter a mira certeira mesmo em movimento, com as alças das bainhas de armas cruzando o peito, elas cortariam metade do busto, ficando sem (a) um seio (mazo). Mas a cirurgia de extração do seio (mastectomia) talvez fosse feita por só uma tribo; elas sempre foram representadas com dois seios.A mutilação seria uma lenda dos homens para assustar as moças, desencorajando-as da idéia de largar a família e se juntar ás amazonas. A destreza inigualável de derrotarem exércitos sempre a cavalo tornou o nome delas o equivalente feminino de cavaleiro. Cultuavam o Deus da Guerra e a Deusa da Caça e só atacavam em grandes batalhões de cavalaria avassaladores, trucidando a todos e dominando as noções de estratégia e tática das falanges que seriam usadas mais tarde pelos atenienses e espartanos.
Elas enlouqueciam os homens gregos, inspirando-lhes sentimentos contraditórios de raiva, admiração, medo, inveja e desejo. Rivais insuperáveis, adversárias imbatíveis e fêmeas inconquistáveis, só lhes restava imaginar fantasias. E esse desejo frustrado de conquista era desabafado na mitologia. Com um ou outro grande herói grego vencendo e desposando uma Amazona, mesmo temporariamente, a fantasia coletiva dos gregos era irreprimível. Mesmo Aquiles se apaixonou perdidamente pela rainha Pentesiléia, “de beleza tão divina mesmo após a morte” que ele até matou um companheiro grego que tentou maltratar o corpo dela.
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Os atenienses nos cemitérios militares faziam grandes homenagens póstumas nos túmulos das suas adoradas inimigas.
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“Matadoras de Homens” (Heródoto), naturalmente, o pensamento bélico delas era criado por sua própria situação única e extraordinária de minoria isolada de sexo frágil sob risco de extermínio. Para minimizar os riscos, preferiam se esconder habitando áreas afastadas, mas também impor respeito e temor. Como odiavam o mundo do patriarcado, elas não podiam confiar em ninguém, e nem poderiam se dar ao luxo de escravizar outro povo, como os espartanos. Assim, a doutrina militar das Amazonas era baseada no princípio da concentração máxima de força para assombrar qualquer exército e esmagá-los numa onda avassaladora.Para destruir a moral do adversário, a atitude era semear choque e pavor. Elas sempre semeavam o pânico entre os oponentes que não tivessem nervos de aço ao encará-las. Elas atacavam sempre com força total para aniquilar o inimigo de uma vez, eliminando o risco de qualquer represália futura. Por isso preferiam não fazer prisioneiros, impondo o choque. Também por isso era um procedimento lógico deixar uns poucos sobreviventes escaparem, para espalhar o pavor.O fenômeno que marcou o desaparecimento da sociedade das amazonas também definiu o início da Idade do Ferro: a Guerra de Tróia por volta de 1000 a.C.
Quando os metalúrgicos da Grécia continental aprenderam a dominar a técnica de fundir o ferro – metal mais duro, pesado e resistente – e produzir o aço que rompia os escudos e armas de bronze dos troianos, a então nascente Grécia virou a mesa e destruiu o maior império colonial da Antiga Era.Já se falava sobre as Amazonas lutando ao lado de Tróia na Ilíada de Homero, a primeira narrativa do Ocidente; mas se na época houve registros de sua existência, eles desapareceram na devastadora guerra contra o Império comercial de Tróia, cuja grande capital ficava na porta de entrada do Oriente e controlava as rotas comerciais da Ásia. O evento foi tão cataclísmico que não houve vencedores: todas as civilizações do Mar Mediterrâneo foram varridas do mapa, incluindo a Grécia.A narrativa mítica foi uma maneira de condenar a tragédia apocalíptica da guerra passando a imagem falsa de que os helenos não foram também derrotados, nem o vil motivo real da guerra: disputas econômicas. O cataclismo histórico da Primeira Grande Guerra Mediterrânea destruiu todas as antigas potências, marcou o fim da Idade do Bronze e fez o mundo cosmopolita mediterrâneo retroceder á vida no campo.
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O antigo mundo épico estava morto, enterrado e esquecido; apenas alguns fragmentos seriam preservados na memória dos poemas de Homero, lembrando um mítico mundo heróico. Esse retrocesso do povo grego, com a lenta recuperação do progresso anterior, foi o Período Homérico. Nele, os relatos do mundo que ainda aceitava as amazonas se fundiram ao folclore da mitologia dos deuses.
“E os soldados gregos, horrorizados com aquela cena tão chocante e brutal, atiraram-se ao mar, gritando: Androcthones! (assassinas de homens). Heródoto, “o pai da História”, documentou relatos do século 5° aC, descrevendo um grupo de mulheres que enfrentaram os gregos na Batalha do rio Térmidon, em sua capital Themiscira, na Ásia Menor.
Numa batalha comum da época, morreram apenas 20% dos soldados de cada lado. Surpresos e impressionados com a resistência e bravura das soldadas, os gregos não executaram as prisoneiras, que foram levadas em navios para serem vendidas como escravas. Eles ainda não sabiam com quem estavam lidando. Mas a surpresa maior viria em seguida. Elas se libertaram, tomaram o controle dos navios e mataram todos os soldados gregos a bordo. Relatos dos sobreviventes que se lançaram na água testemunham que o plano delas era exatamente esse: conseguir um transporte por mar.
Mas, sem experiência na Marinha e inábeis para navegar, as mulheres mudaram o curso, seguindo as correntes do Mar Negro até as costas do Cáucaso – exatamente onde as lendas as situam. As Amazonas de Heródoto atingiram o território dos Cítios, um povo nômade guerreiro de arianos do Cáucaso.
Essas mulheres guerreiras, diz Heródoto, casaram com os Cítios e os convenceram a migrar para as planícies de campos da Eurásia, cruzando as altas montanhas do Cáucaso e os desertos do Mar Negro até se fixarem nas estepes russas – o povo russo usa o alfabeto grego.
A primeira evidência direta do status dessas mulheres guerreiras veio com as escavações arqueológicas recentes. Isso se confirmaria em 1996, com a descoberta de tumbas de fósseis de mulheres armadas para a guerra e a caça nas planícies russas. Nas 150 tumbas do século 5° aC encontradas perto de Pokrovka, nas estepes do sudeste da Rússia, encontram-se soldadas enterradas com armamento militar, muitas com ferimentos de batalha. Junto com espelhos, brincos, colares e outros adornos femininos ricamente elaborados em ouro.
“A forma física delas era bem desenvolvida” diz a arqueóloga Jeannine Davis-Kimball. “Nós vemos isso nas tumbas. Nós encontramos mulheres extremamente fortes, realmente poderosas. Todos os indícios apontam que elas desenvolviam muito a musculatura exercendo a caça. O ambiente rústico (rus, em grego) exigia muito esforço para sobreviver nessas condições. E elas eram grandes.
A maioria dos esqueletos adultos têm cerca de 1,90 metro de altura, o que as tornava 25 centímetros mais altas que a média dos homens gregos do Peloponeso na época. Muitas tinham mais de 2 metros. A superioridade física delas nas batalhas devia ser descomunal. Uma explicação para essa diferença física é que elas sempre escolhiam ter filhos com os guerreiros mais altos, grandes e fortes. Assim, as Amazonas também foram a primeira cultura a praticar deliberadamente a eugenia (em grego, seleção genética)”.”Imagine o espanto dos soldados gregos ao deparar com um inimigo assim. Para eles, seria como encontrar um ser mitológico na vida real. Se alguém sobrevivesse para contar a estória, ninguém acreditaria. Só vendo os corpos das guerreiras, quando encontravam, pois elas sempre levavam as soldadas mortas consigo. De qualquer jeito, nenhum homem ia admitir que perdeu uma luta para uma mulher. Natural que acabassem se confundindo com a própria mitologia naquela época esquecida. Para elas, isso era outra vantagem: quanto menos gente acreditasse na existência delas, mais seriam deixadas em paz. Se acreditavam, sabiam que era melhor nunca atacá-las. Uma mulher disposta a sacrificar um seio para aperfeiçoar sua destreza de matar deveria ser de um sangue-frio extremo. Mulheres extraordinárias assim são capazes de qualquer coisa. “Não surpreende que as Amazonas sempre matavam todos os seus inimigos. Devia ser uma cena assustadora. Um ataque delas era sempre um espetáculo devastador de aniquilação. Cada batalha era uma matança das mais chocantes.
Muitos diziam que elas apareciam do nada. Soltavam gritos assustadores, como se estivessem possuídas por demônios, e faziam caretas pavorosas com o olhar ensandecido de sede de sangue, sendo vistas como verdadeiras emissárias da morte.”"Elas asseguravam a vantagem massacrando impiedosamente todos os homens no campo de batalha. Eram de uma determinação inabalável, dispostas a tudo para vencer e conservar sua supremacia. Só assim poderiam impor respeito aos homens e garantir sua segurança: aceitando a preparação para a guerra permanente. O grande paradoxo sobre as Amazonas é que, ao se livrarem dos homens, foram as mulheres que inventaram a sociedade mais militarista de todos os tempos. Só podemos imaginar o impacto que isso teve sobre a construção da psique feminina. Deviam ser as mulheres mais estranhas da História.”
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Durante milhares de anos, as superguerreiras assombraram o mundo com seus feitos. Mesmo vivendo discretamente em reinos isolados, tiveram uma história que se alongou por mais dois milênios após o fim da Idade do Bronze onde reinaram supremas.
Recentemente, restos mortais de guerreiras Amazonas combatendo no exército do Império Romano na Grã-Bretanha foi descoberto num cemitério em Brougham em Cumbria. Até o fim da Idade Média, uma certa ilha do Mar Egeu continuou a abrigá-las. Ironicamente, o ato final da História das Amazonas foi também o de triunfo máximo.Na ilha de Lemnos, governada pela rainha amazona Maroula, que venceu o Império Otomano. Parece uma peça épica grega. Impossível melhor final feliz: as Amazonas venceram os maiores imperialistas – os islâmicos. Elas impuseram a humilhação absoluta aos piores machistas – os muçulmanos. Desde então, a ilha de Lemnos celebra a vitória do maior herói nacional, ou melhor, heroína nacional.
Uma das principais atrações turísticas de Lemnos, a estátua de Maroula, relembra a bem-sucedida defesa da liberdade.
O largo cinturão de aço usado por sua Rainha Hipólita foi o objetivo (pacífico) de um dos 12 Trabalhos de Hércules, com quem ela teria tido uma filha semideusa, Diana: a própria Mulher-Maravilha do dr. Marston. Ele usou esse mito para construir o arquétipo moderno da Super-Mulher do futuro, em equivalência com o Super-Homem do filósofo alemão Friedrich Nietzsche.
No Brasil: a origem do nome do rio Amazonas vem dos primeiros aventureiros brancos, que ficaram estupefatos ao testemunharem a cena de mulheres índias cavalgando animais selvagens com destreza de cavaleiras (amazonas) cujas tribos indígenas eram tão primitivas que nem sequer reproduziam o modelo de família patriarcal, mas matriarcal. E no Xingu, viram a cerimônia anual em honra á Deusa-Mãe Natureza: para lembrar a todos quem manda, as mulheres índias surram todos os homens da aldeia. Nem o cacique escapa.
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FONTE: Ernesto Ribeiro