Hades (Plutão), ao lado dos irmãos Zeus (Júpiter) e Poseidon (Netuno), travaram uma longa guerra de dez anos contra o pai Cronos (Saturno) e os Titãs. Após a vitória dos três irmãos, uma nova ordem e poder estabeleceu-se sobre o mundo e os deuses, na partilha dessa nova ordem, coube a Zeus o reino do céu e da terra, a Poseidon o mar, e a Hades as profundezas da terra, conhecidas por Érebo, Infernos ou Hades. Se Zeus reina do Olimpo, ao lado de mais 11 deuses, Hades é o senhor absoluto do reino dos mortos, o décimo terceiro deus.
Hades tem como súditos os mortos, mas o seu domínio é a extensão final de todos os vivos, daí ser respeitado e venerado por eles. Reina taciturno nos subterrâneos, sendo auxiliado pelas criaturas infernais, que ao seu lado, mantêm a ordem e as sentenças nos reinos das trevas. Hades traz um capacete mágico, feito pelos Ciclopes, que o torna invisível diante dos deuses e dos vivos. Esta capacidade é a raiz da origem do seu nome, Hades em grego significa invisível.
O mito de Hades não gerou muitas lendas diretas, mas às criaturas adjacentes ao seu mundo. A lenda mais conhecida é a do seu amor por Perséfone (Prosérpina), movido por uma violenta e arrebatadora paixão que o faz raptar a jovem e levá-la da Terra para o subterrâneo do seu reino. No Érebo, o deus dos mortos faz de Perséfone a sua esposa, dividindo com ela o trono. A lenda do rapto de Perséfone, uma das mais belas da mitologia, retrata a origem da primavera sobre a terra. É o amor no mundo dos mortos estendo-se às belezas terrestres.
Hades e as Divindades Infernais
No princípio da civilização gregas, a representação do mundo dos mortos não trazia qualquer conotação de prêmio ou castigo para os seres humanos que findavam, o Érebo era descrito como uma vasta planície no subterrâneo da terra, onde os mortos vagueavam como sombras, desprovidos de sentimentos como a dor, a alegria e sem a inteligência da alma. O mundo dos mortos representava a apatia total e eterna sobre a vida. À medida que a civilização helênica evoluiu, criando as cidades estados, a sua organização trouxe a disciplina, a justiça e a ordem, elementos essenciais para a sobrevivência da vida coletiva. Esta organização não evita a morte, e ela passa a ser refletida na ordem dos vivos, e na recompensa que se tem de ser justo. Um novo conceito dos Infernos surge, e ele é dividido em dois lados separados pelo rio Aqueronte. De um lado está o Tártaro, lugar da expiação dos maus, onde os injustos pagam as suas culpas; do outro lado os Campos Elísios, conhecidos também como a ilha dos Bem-Aventurados, lugar no mundo das trevas onde os que foram bons em vida usufruem, depois de mortos, as recompensas das suas ações.
Se Zeus tem os deuses do Olimpo para governar sobre o céu e a terra, Poseidon tem as nereidas, as sereias, os tritões e outros seres marítimos para governar os mares e rios, também Hades tem as divindades infernais. Três juízes, Minos, Radamanto e Éaco, decidem em julgamento presidido pelo próprio Hades, de que lado dos Infernos habitará cada morto.
Caronte é o barqueiro que recebe os mortos quando chegam ao Érebo, cabe a ele, pelo pagamento de um óbolo, atravessar as almas pelo rio Aqueronte. O pagamento de Caronte é feito pela moeda que os parentes dos mortos punham na sua língua durante o funeral. Quem não levasse a moeda, os insepultos, ficariam vagando para sempre, às margens do rio, chorando.
O guardião dos portões do Hades é Cérbero, furioso cão negro de muitas cabeças, filho do monstro Tifão e de Equidina.
Tânatos (Morte) é o principal auxiliar de Hades. Tânatos é quem traz as almas, independente dos desígnios de Hades. A ele ninguém escapa. Tânatos é um deus grego, na mitologia romana a morte é uma deusa, Mors. Tânatos auxilia Hades, mas está ligado diretamente às vontades do Destino, deus de força superior aos próprios deuses. Quando o Destino marca a hora final de um ser vivo, Tânatos envia as Queres, divindades que se apoderam do mortal, golpeando-o e arrastando-o para o Érebo. Se o mortal era um assassino ou perjuro, cabe às Erínias ou Fúrias, três deusas negras, aladas, com cabeleiras de serpentes, ir buscá-lo no lugar da Queres.
Hades, apesar de todo o poder do seu reino, raramente interfere nos desígnios humanos ou dos deuses do Olimpo, a menos que por eles invocado, para que se cumpra a justiça da morte sobre a iniqüidade dos vivos. Hades quando invocado, abre o caminho para as maldições, findadas na tragédia da morte. Por ser um deus que vive debaixo da terra fértil, era visto como quem propiciava o desenvolver da semente plantada nos limites dos seus domínios, favorecendo a germinação e produtividade dessas. Esta veneração era feita principalmente pelos romanos, que identificaram Hades com Plutão, nome que significava “aquele que dá a abundância”. Para invocar Hades, eternamente invisível aos olhos humanos, os seus devotos batiam no chão com as mãos ou com varas.
Hades, ao lado de Perséfone e das divindades infernais, reina sob os mortos, não emergindo nunca ao reino dos vivos. Apesar do amor por Perséfone, é estéril, deste amor não nasce nenhum filho.
Hades e Perséfone, o Amor no Reino dos Mortos
Hades sempre fora um deus soturno, solitário e recolhido em si. Nascera da união entre Cronos e Réia (Cibele). Cronos, deus do tempo e rei dos deuses, temendo à profecia de que um dos filhos o iria destronar e aprisionar, devorou-o tão logo nasceu. Mais tarde, Hades foi vomitado pelo pai, depois que o irmão Zeus dera ao deus do tempo, uma porção mágica para ingerir. Saído das entranhas de Cronos, Hades lutou ao lado dos irmãos contra o reinado do pai. Após a vitória, coube a ele, por seu jeito taciturno e solitário, reinar sobre os mortos.
Hades mostrava-se imune ao amor de qualquer deusa ou de qualquer mortal. Seu frio coração irritava Afrodite (Vênus), deusa do amor, que sempre fizera deuses e mortais sucumbirem à sua arte. Hades continuava com o coração intacto e frio. Corria solitário todas as partes do Érebo, que governava energicamente. Um dia, Hades ouviu as varas que os humanos batiam sobre a terra, invocando-o com o sacrifício de duas cabras negras. Ao sentir o sangue quente dos animais molhar o chão, Hades pôs sobre a cabeça o capacete que o deixava invisível, emergindo das entranhas mais profundas da terra, até a superfície do mundo dos vivos, aceitando assim, o sacrifício.
Raramente o senhor dos mortos vinha ao mundo dos vivos. Na terra os campos eram eternamente floridos e cobertos de frutos. Hades caminhava invisível, por onde passava, trazia um vento frio que soprava sobre os humanos, fazendo-os arrepiar e a invocar proteção aos deuses do Olimpo. Caminhando solitário, Hades avistou ao longe, no meio do bosque florido, a mais bela jovem que os seus olhos já tinham contemplado. Era Core. Com o coração a bater como nunca sentira dantes, o frio senhor dos mortos viu emergir de dentro dele um estranho e implacável calor. Invisível, aproximou-se de Core e das amigas. Carinhosamente soprou em seus ouvidos. Core sentiu aquele estranho sopro. Enquanto as amigas arrepiaram-se de temor, a jovem arrepiou-se acometida de uma ternura infinita.
Core sorriu, de repente, o que fez com que Hades se mostrasse visível aos seus olhos. A bela jovem viu surgir à frente o rosto daquele deus forte, olhar grave, de sorriso escorrido e gestos austeros. Apaixonado, Hades cobriu o cabelo de Core com as violetas que colhera no bosque. Revelou-lhe o amor e o desejo de fazê-la a sua esposa eterna. Core ouviu a declaração de Hades, mas nada respondeu, precisava consultar a mãe, a deusa Deméter (Ceres), e o pai, o poderoso Zeus.
Mas o imprevisto aconteceu, Deméter, deusa da agricultura e dos alimentos, sabia que o reino de Hades, o seu irmão, era nas profundezas da terra. Decidiu que não se iria separar da filha, proibindo que ela desposasse o senhor da escuridão.
Hades ficou inconsolável. Subiu ao Olimpo e pediu a ajuda do irmão Zeus. Estava perdidamente apaixonado por Core, já não conseguia viver sem ela. Zeus ouviu o irmão, como sabia da recusa de Deméter em deixar a filha partir para o Érebo, aconselhou a Hades que esperasse algum tempo, para convencer a deusa da agricultura a aceitar o casamento da filha.
Algum tempo se passou, mas Deméter não removeu a recusa. Proibiu definitivamente que Hades cortejasse a filha. Diante da dor causada pelos obstáculos impostos por Deméter, Hades não desistiu, fortaleceu ainda mais o amor que trazia dentro de si. Perdido de paixão, subiu à Terra, disposto a ter definitivamente, o amor da bela Core, mesmo sem a permissão de Deméter.
Hades foi encontrar Core a passear pelo vale de Ena, que trazia em sua paisagem a beleza da eterna primavera. A bela colhia os lírios e as violetas às margens do lago de água cristalina. De repente surgiu o mais belo dos narcisos à beira do lago, de uma cor tão reluzente que encantou Core. Como se hipnotizada pela flor, ela debruçou-se sobre o lago para pegá-lo. Foi quando a terra abriu-se em um imenso abismo de escuridão, dele emergindo um carro de ouro puxado por cavalos, conduzidos pelo próprio Hades. Num impulso rápido e certeiro, o senhor do Érebo arrebatou a frágil e bela Core. Assustada, a jovem lançou um grande grito que ecoou pelos campos, enquanto o carro de ouro a conduzia até o Tártaro.
Deméter ouviu o grito da filha. Correu em seu auxílio, mas quando chegou, viu a terra fechar-se e ela desaparecer nas profundezas do mundo dos mortos. Desesperada, a deusa procura pela filha. Ninguém no Olimpo sabe o que lhe aconteceu. Quem lhe alivia a falta de notícias é Hélios (Sol), que tudo vê, revelando à deusa que Hades tinha raptado Core. Zeus confirma o rapto. Revela à deusa que Core ao cruzar as fronteiras dos Infernos, tornara-se a esposa de Hades, e como rainha do Érebo, passou a chamar-se Perséfone (Prosérpina). Sem poder atravessar as fronteiras do Érebo em socorro da filha, indignada com Zeus e Hades, Deméter abandou o Olimpo, indo viver com os homens da terra. Abandonou os campos e as plantações, deixando de proteger as colheitas. A primavera eterna desapareceu da terra, levando-a ao inverno e à fome.
Zeus viu a fome assolar a humanidade. Interviu diante de Deméter, mas a deusa só voltaria a proteger a agricultura e aos campos se tivesse a filha de volta. À face da catástrofe que se abatia sobre o mundo, Zeus enviou Hermes (Mercúrio), ao reino de Hades, com a ordem de que ele devolvesse Perséfone à mãe, para evitar que a humanidade faminta, rebelasse-se contra o poder dos deuses.
Hades não se contentou em perder a amada. Mas não poderia desobedecer a ordem de Zeus. Chamou Perséfone à sua presença. Olhou com paixão para a esposa. Diz a ela que deverá acompanhar Hermes até o mundo dos vivos, sendo devolvida à mãe. Triste, beija a face da amada. Em um último ardil, oferece-lhe uma saborosa romã como lembrança do seu amor. Perséfone come a fruta, sem saber da regra que estabelecia: quem comesse qualquer fruto no Tártaro a ele teria que retornar. Perséfone despediu-se do marido, regressando ao mundo dos vivos.
Deméter recebeu a filha com alegria. Os campos voltaram a florir. Ao abraçar a filha, a deusa lembrou-se de perguntar se ela havia comido alguma fruta no Tártaro, ao que a jovem respondeu afirmativamente, comera o bago de uma romã. A deusa desolou-se, sabia que a filha teria que voltar ao Tártaro todos os anos. Diante do ardil, ficou estabelecido por Zeus que Perséfone passaria uma parte do ano ao lado do marido, reinando no Érebo, outra parte ao lado da mãe, na terra e no Olimpo. Assim, durante o tempo que Perséfone despede-se da mãe e retoma o caminho do Érebo, a deusa recolhe-se à tristeza da sua saudade. Em conseqüência dessa tristeza, as árvores perdem as folhas e as flores, os campos ficam sem as plantas, o inverno invade a terra com o seu vento frio e cortante, deixando-a desolada e coberta pelo gelo. Quando Perséfone retorna aos braços da mãe, alegrando-lhe o coração, as folhas voltam verdes às arvores, as flores invadem os campos, trazendo a primavera novamente ao mundo.
FONTE: JEOCAZ LEE-MEDDI